O Radioso Futuro de Gaza está a chegar!
Já começou a surgir entre os compadres e as comadres que se dedicam a fazer malha e lançar cartas no comentariado escrito e televisivo a magna questão do futuro de Gaza. Parece que ninguém, a não ser o cândido Cravinho (nunca se sabe se é candura se pura venda a retalho), acredita já na falácia dos dois estados. Há que vender outro produto. Será que a Autoridade Palestiniana (que perdeu as eleições,) irá fazer de comparsa numa farsa em que Gaza surge como um quintal israelita com palestinianos selecionados e esterilizados? Será o governo de Israel a nomear um governador? Magnas questões que entreterão uns tantos biscateiros no intervalo dos comentários a penaltis e foras de jogo do futebol.
Mas a questão do futuro de Gaza e dos palestinianos está decidida e resolvida há anos. Como nas touradas, a faena está no seu tércio final, no seu fim, e estamos a assistir aos momentos que precedem a morte da vítima que esteve encerrada e foi solta para ser morta. Estamos no tempo do rufar dos tambores. Assistimos ao número de fantasia e de genocídio que o Estado de Israel e os Estados Unidos estão a consumar para justificar a operação de destruição e limpeza de Gaza.
Qual é o objetivo do Estado de Israel e dos Estados Unidos para a ação de limpeza e massacre que está a ser levada a cabo em Gaza? Um pouco de distância para ganhar perspetiva:
Em seis de Outubro Benjamin Netanyahou era um político prestes a ser julgado por corrupção e que estava a ser acossado como golpista por parte da opinião pública. Pois, além de corrupto, pretendia dar um golpe constitucional e colacar o sistema judicial ao serviço do governo. Era um has been, um marginal, um tipo que mesmo num Estado de apartheid e com o passado de violência e desrespeito pelos mais elementares valores humanos era para atirar ao lixo. Era um lixo. No dia sete de Outubro Netanyahou passou a ter a utilidade do lixo: desde que tratado podia ser reciclado em pó químico para eliminar espécies inconvenientes. Podia servir para realizar trabalhos sujos, servir de esfregão!
A estratégia dos Estados Unidos e do grupo dirigente de Israel desde a fundação, em 1948, foi a de criar um estado etnicamente unitário, onde os palestinianos não têm lugar. Israel é desde a fundação um “forte”, uma base avançada dos EUA no Médio Oriente. Na situação de crise de liderança mundial que vivemos, com o surgimento de novos atores a disputar a hegemonia dos EUA (os BRICs, por exemplo) é decisivo que estes disponham de suportes de absoluta confiança nas zonas críticas: Israel para o Médio Oriente, a Sul; a Ucrânia para a Eurásia, no Centro e os estados bálticos (mais a Finlândia e a Suécia — daí a entrada na NATO) a Norte. É uma clássica manobra de tenaz, de ataque pelos flancos, que pode ser transformada numa manobra em cunha, com o esforço principal ao centro — a Ucrânia. Curiosamente os comentadores militares nunca referem esta típica manobra de operações ofensivas! É de chamar os comentadores de futebol que esses percebem do assunto.
Os dirigentes do Estado de Israel sabiam desde há um ano que o HAMAS iria tentar fazer uma operação de alívio do cerco a Gaza. Se essa operação foi ou não incentivada e promovida pelo Estado de Israel é uma questão que deve ser colocada (tanto quanto se sabe nenhum chefe de serviços de informações nem de serviços secretos foi demitido por não ter descoberto o que parece que todos sabiam, dos egípcios aos ingleses e, evidentemente, dos EUA). É hoje evidente que a operação do HAMAS sobre uma aldeia estratégica guarnecida por colonos serviu de pretexto para a brutal e decisiva “resposta” israelita a que estamos a assistir.
A brutalidade que algumas boas almas se dignam considerar excessiva, desde que precedida da oração de condenação do “bárbaro ataque do HAMAS”, é condição necessária para atingir os objetivos fixados. A ação do HAMAS teria de ser chocante o suficiente para justificar a violência extrema de Israel, mesmo correndo o risco da repercussão mundial negativo.
Gerir o excesso indispensável, a desumanidade da resposta, exigiu que fosse encontrada uma figura execrável e queimada, alguém que desse a cara por um genocídio. Uma criatura sem valores, e ninguém melhor que Netanyahou, um Zé do Lixo, como alguém o designou para desempenhar esse papel. Netanyahou é hoje o rosto do pide mau. Do tipo execrável. Serve à perfeição como o rosto do sanguinário.
Dentro de poucos dias, quando Gaza estiver arrasada e os palestinianos mortos e os sobreviventes reduzidos à condição de restos humanos, distribuídos por campos de refugiados, surgirá o polícia Bom, os Estados Unidos, com um Biden sorridente, (ele necessita de uma boa imagem para as eleições) e um qualquer dirigente israelita que substitua o anjo da guerra do Netanyahou com uma pomba branca na mão, ambos a estabelecer um cessar-fogo, a prometer abrir fronteiras à ajuda humanitária, o israelita a fazer de sacristão na rábula de Biden, homem de paz e com os dirigentes da U E sorridentes, com a senhora Ursula Von Der Leyen e o senhor Borrel a cantarem o hino da União.
Netanyahou e o pequeno gangue à sua volta no que designam por Conselho de Guerra serão entregues a uma empresa de Tratolixo. Serão passados por um túnel de desinfeção, de limpeza. Já negociaram entretanto os futuros, serão esquecidos, reciclados, e toda a máquina de manipulação baterá palmas. Haverá eleições — Israel voltará a ser a única “democracia do Médio Oriente”! Os comentadores garantirão que, finalmente, venceu o bom senso e prevaleceu o respeito pelos direitos típicos da civilização ocidental! Deus descerá de novo à Terra! Até haverá lugar a prémios nobel da paz, se for necessário! Todos nos felicitaremos. A farsa foi um êxito!
Gaza será um cemitério em ruínas. Virão os bulldozers, após a saída dos tanks. Sobre os escombros serão edificados bairros, escolas, universidades, sinagogas, flutuarão bandeiras israelitas. Haverá um monumento aos soldados israelitas que libertaram Gaza do Hamas. Haverá um busto (discreto) de Netanyahou, como mais um dos conquistadores de um talhão da Terra Prometida. Os seus pecados, se os tiver cometido, serão perdoados. Um dia, daqui a uns tempos, alguém se lembrará destes tempos e haverá a vingança. Estamos a assistir à sua sementeira…