Carlos Matos Gomes
3 min readFeb 4, 2022

O Paradoxo da Escolha do PSD — e o neoliberalismo

O PSD vive hoje o paradoxo da escolha que já atingiu mortalmente o CDS: Ser neoliberal ou ser social.

O neoliberalismo é fruto dos anos 70, e a sua versão prática foi estabelecida para contestar o modelo do Estado de bem-estar social do pós Segunda Guerra. Uma das primeiras experiências neoliberais foi levada a cabo no Chile. O ditador chileno Augusto Pinochet entrou em contacto com professores da Escola de Chicago (Milton Friedman, p.ex), que recomendaram medidas pró-liberalização do mercado e diminuição do Estado. Entre medidas constavam a drástica redução da despesa pública, demissão em massa de funcionários, e a privatização de empresas estatais. As eleições de Margareth Thatcher no Reino Unido e de Ronald Reagan nos Estados Unidos no início dos anos 1980 foram indicativos desse fenómeno de instauração da lei da selva económica e social, darwinismo social, chamaram-lhe, vencem os mais fortes e ai dos vencidos, a pobreza é fruto da preguiça ou da ausência de espirito lutador, não há sociedade, apenas clientes e consumidores.

Um conjunto mais claro de ideias neoliberais surgiu em 1989, quando o economista John Williamson publicou um artigo apresentando um conjunto de regras acordadas com as grandes instituições financeiras e que ficariam conhecidas como Consenso de Washington. Seriam o mínimo denominador comum da ideologia dos neoliberais:

• Redução da despesa pública (à custa de diminuição de serviços públicos);

• Reforma fiscal (que beneficie os rendimentos mais altos);

• Juros de mercado

• Abertura comercial

• Investimento estrangeiro direto

• Privatização de empresas estatais/públicas

• Desregulamentação (flexibilização de leis económicas de do trabalho)

Este foi o programa neoliberal, sem tirar nem por, dos governos do PSD de Passos Coelho. Privatização de tudo (TAP, aeroportos, portos, pontes, estaleiros); incentivo à educação e à saúde privada, as PP dos hospitais, tão defendidas pelos bastonários dos médicos e enfermeiros e sindicalistas afetos aos grandes grupos de saúde privada, fundos privados de reformas, despedimentos, incentivo à emigração, redução de reformas e pensões, aumento de horas de trabalho. Tiveram o resultado conhecido, aliás previsto por economistas do FMI: As medidas neoliberais aumentam a desigualdade, causam instabilidade social e prejudicam um crescimento sustentado.

Este é o retrato do programa neoliberal do PSD de Passos Coelho. Agora, aproveitando a indefinição ideológica do PSD, entre o neoliberalismo puro e duro e um tímido programa social, e um governo social-democrata do PS, surgiu a Iniciativa Liberal, a propor um programa idêntico ao do PSD de Passos Coelho. A Iniciativa Liberal é um Passos Coelho 2.

O PSD está agora num dilema, num paradoxo da escolha: ou se afirma neoliberal e ressuscita as políticas de Passos Coelho (já com pouco para privatizar), e enfrenta a concorrência dos puros sangues da Iniciativa Liberal, o que causará a rejeição garantida de setores da sociedade, que embora conservadores querem ter o apoio do Estado e de políticas públicas; ou se apresenta como um partido com preocupações sociais e tem a concorrência do PS e a animosidade dos grandes interesses, que já estão a financiar a IL.

A escolha de um líder nestas circunstâncias implica uma prévia definição de políticas. É aqui que bate o ponto. Os pró-chilenos da Iniciativa Liberal afiam facas e salivam… Passos Coelho deve estar a marcar um jantar com Cotrim de Figueiredo, cada um com a sua Maria Luís Albuquerque, com o seu Relvas.

Carlos Matos Gomes
Carlos Matos Gomes

Written by Carlos Matos Gomes

Born 1946; retired military, historian

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