Ativista e ativismo — o espetáculo prejudica as causas
De vez quando surgem notícias de ações atribuídas a uma classe de agentes designados “ativistas”. A mais recente é a da leitura da sentença de uns “ativistas climáticos” que ocuparam instalações de uma universidade.
O ativismo, climático ou de outra causa, é em principio uma atividade meritória e estes jovem merecem a minha simpatia. O ativismo é também uma atividade natural, pois o que distingue os seres vivos dos elementos inertes da natureza é a ação. Agir é vital e até mesmo os faquires, imóveis e em morte aparente sobre um colchão de pregos, estão ativos.
A minha questão não o ativismo em si, mas o tratamento que lhe dão os meios meios de comunicação e manipulação de opiniões. A maioria da notícias de atividade dos ativistas dizem respeito a disparos de tintas e massas a pinturas clássicas, a pinceladas de monumentos, à inscrição de frases que transmitem em geral a inércia do pensamento dos autores (ativistas e não pensadores) e a umas ações de ocupação de instalações públicas.
Chegamos assim à primeira caraterística do ativista transmitida pela grande imprensa: ele age e o pensamento fica por conta dos sujeitos das suas ações. O ativismo surge como um espetáculo inconsequente, ou, no mínimo sem explicações nem propostas. O que é realçado nas ações dos ativistas não são propostas, nem causas, são “alertas”, ”denúncias”, “contestações”.
Na imagem que dele é transmitida, o moderno ativista surge associado ao de performer, um “faz tudo” nas antigas trupes de circo, e também como um influencer, uma categoria de chico-espertos e chica-espertas que vendem as suas vulgares ideias a quem vive no vazio dos telemóveis e dos tablets. Duvido que esta imagem de ativista sirva as suas causas e, principalmente, que sirva as causas que merecem ser defendidas para bem geral.
O ativismo político e social devia ser o resultado de preocupações com a forma como existimos, com o nosso futuro, com a relação com os outros, como um ato revelador de consciência e de generosidade. Todos devíamos ser ativistas. O problema começa quando o ativismo é caraterizado como uma atividade trupeira, quando é deliberadamente apresentado pelos meios de manipulação, conservadores por natureza, como uma atividade de marginais mais ou menos inimputáveis, quando o ativismo é reduzido ao superficial em detrimento da racionalidade.
O preocupante é que os ativistas de hoje deixaram que os apresentassem como uma trupe de pícaros e que o ativismo por questões políticas e sociais seja reduzido a um fenómeno de classes médias ilustradas, na versão mais generosa, e a um fenómeno de gangsterismo político na versão de submundo do Chega e afins.
O ativismo não deve ser uma atividade picaresca, nem, ainda menos, uma atividade violenta e antissocial, de cariz totalitário, dos extremistas reunidos nas organizações neonazis e neofascistas que estão em desenvolvimento entre nós.
O ativista não pode deixar que o associam ao irresponsável simpático que age em nome do que entende serem os grandes valores da humanidade, nem ao marginal integrado num gangue para impor uma velha ordem de privilégios e desprezo pelos direitos de igualdade que são conquistas históricas em perigo.
A exaltação do folclore associado ao ativismo maioritariamente juvenil e generoso é uma armadilha criada pelas sociedades do espetáculo da informação e arrasta consigo o risco de o ativismo ser o pior inimigo das causas mais ou menos justas que defende.
É interessante reparar como os ativistas profissionais do regresso ao absolutismo do antigo regime evitam enunciar causas. Quando muito falam em reformas estruturais. Quanto ao resto são genericamente do Contra, a causa mãe dos demagogos. O ativismo não deve ser associado à demagogia populista.